quinta-feira, 2 de junho de 2011

PEREGRINAÇÕES DE ISAÍAS AO REDOR DE SI MESMO



Escrito por Jorge Bandeira

Dedicado à memória de Cleyton Mady.



Atravessei por muito tempo desertos e colinas eventualmente nuas, com meu corpo em estado de nudez a pedido de Deus. Em principio fiquei preocupado com as críticas familiares e de vizinhos que sempre estão preocupados com o decorrer de nossas vidas, o que fazemos, o que comemos e bebemos e toda a sorte de inquietações que permeiam aos homens de boa vontade. Vontades, com pouca ação. Minha nudez celeste, por ser um chamado da divindade total, me trouxe a certeza que teria muito que fazer em minha jornada nudista, de pés descalços e purificando minha alma. Os eventuais dissabores que vivi durante este trajeto relato agora a meus nobres leitores, para que de minha palavra escrita não reste dúvida, e que não tenha um significado obtuso. Não esconderei nada do que ocorreu comigo, e sei que esta franqueza refaz os poros de meu corpo em sua integridade máxima, a nudez talvez seja recriminada em muitas partes deste mundo pecador, mas a nudez da qual faço parte é um contato de meu ser com a natureza divina e terrestre. Muitos me acusarão de louco, demente, desvirtuado e amoral. Atire a primeira pedra, dirá um ser supremo que ecoará em muitas mentes, no maior século, o XXI. O hoje é tudo, e não resta muito tempo para que a defesa deste corpo nu aconteça. A nudez me foi permitida por Deus, isso não se nega pelos textos sagrados que me foram transmitidos e dos quais eu mesmo sou um vetor. Aos que têm ouvidos, ouçam, aos que sabem ler além das letras agrupadas, que leiam, com toda a serenidade de seus corações. Tenho comigo que por tudo que passei, minha experiência será dignificante àqueles que desejam o corpo nu com olhos outros, com retinas sensíveis ao respeito ao próximo, com capacidade de vislumbrar esta nudez tal um líquido que inebria sem embriagar, com a atitude ímpar de uma criança nua que brinca no bosque da tranqüilidade, não o Éden com a serpente pronta a dar o bote terrível, e sei que meus leitores terão esta nobre tarefa, qual seja, a de perpetuar este mundo que habitamos feito uma sombra que aguarda o descortinar de uma alvorada benéfica. Eu tenho esta missão, e se vocês permitirem, os levarei a este mundo de minha pregação em total nudez, por entre florestas e seres fantásticos, habitando vales emoções indescritíveis, e sei que este desafio percorrerá minha vida e a futura imagem que os fieis farão de mim.

 Chamo-me Isaías, e cada vez mais a certeza deste nome me coloca com a ambição de salvar algo, ou pelo menos tentar. A primeira visão que tive de Deus foi quando estava com poucos anos, e não tinha a certeza se realmente era Ele, Deus, que estaria ali comigo, ao pé de uma antiga árvore de carvalho. Era, era Ele. Reconheci pelo manto esvoaçante que deixava antever uma visão indefinida entre o corpo nu e uma pele feita de alva coloração. Deus estava comigo, minha felicidade era radiante. Um carvalho envelhecido e um campo de flores altaneiras, repletos de odores que entravam por minhas narinas e que, após a chegada do pai celeste, transbordou por todo o ambiente natural. A visão de Deus me trouxe dúvida e paz, estranhamente. Minha mente tinha apenas uma preocupação: o que Deus estaria fazendo ali, ao meu lado, flutuando feito uma nuvem inconsútil? Cada minuto parecia uma eternidade, até que o Pai Celeste me pronunciou esta sentença:  -Isaías, deixa esta terra fértil de indagações e vai pelo deserto até chegar às terras do Egito, levando a palavra de consolo para que o amor seja levado aos mais distantes frontões deste planeta errante. Diante desta convocação, retorqui: E qual o motivo de escolher a mim, simples homem que habita um lugar qualquer? Cada momento era decisivo, e sei que o relógio do tempo passava indelevelmente. Deus, novamente, sentenciou: Isaías, eu te ordeno que caminhe em plena nudez por três anos, ao longo deste período deverá enfrentar toda a sorte de intempéries, e sobre teu corpo te cobrirá somente a tua missão divina, levar ao povo, Nu, a força da palavra que entrará triunfal nas mentes dos incautos. Minha preocupação foi crível: Nu, não me levarão a sério, pois me considerarão um louco, um ser perdido neste mundo de roupas multicores. A capacidade de entrar neste mundo, em total nudez, me deixa atordoado. Deus foi incisivo: Isaías, nada mais falarei, e terei de ti um servo que peregrina nu e descalço por todos os limites. OS LIMITES, NA VERDADE, NUM PRIMEIRO MOMENTO, ESTARIAM EM MINHA MENTE, LIBERTA DA CADEIA OPRESSIVA DAS ROUPAS. O vento fazia as folhas do orvalho ancestral balançarem de um lado a outro, com força e determinação. A minha tarefa seria como a deste vento, balançar as folhas que repousavam ao sabor da inércia. Meu corpo seria este movimento que despertaria nos seres humanos a inquietação pela imagem perdida do corpo nu, estacionada em jardim das primeiras páginas bíblicas. Acredito ser esta a minha tarefa essencial, neste mundo cada vez mais calejado de injustiças. Um ser em nudez que tentará vestir as mentes de pensamentos positivos e que não torne o corpo nu de quem quer que seja um receptáculo de desvios variados. Há muito esperei este chamado inesperado de Deus, e como estou nu agora, simplesmente aposto que a luta inicial foi deflagrada. Nu, eu e meu corpo, junto com minha mente somos condutores de um porvir de ações naturais, em meio a catástrofes de guerras e mutilações, oferece de bom grado a minha querida vida a este ser Nu que povoa a mente de muitos, homens e mulheres de bem. A desertificação das florestas é uma cruel realidade, e somente com a nudez total neste antigo testamento terei condições de adentrar no universo dos malditos depravados, inimigos à espreita da nudez consolidada por Deus e retirada pela serpente maligna do mal dos desviados socialmente. O estado persegue os justos, e os injustos ficam na esquina dos desertos áridos da juventude, em busca de um corpo nu para ultrajar. Deus, por mim, um ser Nu, consolida desta forma a vertente Naturista no livro sagrado cristão. Noé Nu, Pedro Nu, Davi Nu, os grandes profetas em nudez que clamam por um mundo melhor para todos, nus ou não. Melhor seria se A NUDEZ já estivesse consolidada a partir do Éden. Um gravurista como Gustave Doré teve muito trabalho ao cristalizar imagens de um inferno dantesco repleto de nus inúteis. Nossos nus e nuas, amigos e amigas em completa pele exposta, sem roupas, aventuram-se em jornadas dignas de notas, relembrando que o uso da roupa não confere dignidade a coisa ou ser qualquer, e que somente se o olhar nu e sem a malícia do aproveitamento do corpo nu será capaz de elevar o homem e a mulher ao patamar de seres totais, e aqui não permitiremos uma vaga utopia de eternidade, a eternidade é o agora do corpo nu, uma asa de pássaro promissor que alcança o cume de uma montanha feito o Ararat, onde a arca despejou animais sem vestimenta e seres humanos que talvez tenham descido nus e nuas e em farrapos e molambos. O corpo em sua nudez atravessou séculos e teve a audácia de numa terra tropical vestir o que não era para ser vestido. Índios serão receptáculos de um corpo nu elogiado pelas lentes de todos os objetos de registros de imagens. Séculos, milênios depois disso que narro neste exato momento. Nu, sei que devo ir agora ao encontro de um desconhecido. Deus, que me permitiu esta jornada e esta narração aos nus e aos vestidos de roupas e carcaças pesadas, enseja-me com uma pequena oração à nudez, antes de adentrar, feito Dante, neste deserto de minha mente, untando minha pele de toda a coragem e minha mente de toda sapiência, para que meu trajeto seja o mais exemplar possível aos propósitos divinais. A oração à nudez antecede ao jejum a que me submeto a partir destas linhas envoltas em papiros que submergirão de uma caverna tempos depois. Fechem seus olhos e tirem suas roupas: assim como meu corpo foi criado de uma substancia nua, minha nudez será coberta de substäncias nuas. Assim como minhas antigas vestes conduziram sujeiras, minha nudez desintegrará todos os resquícios de iniqüidades cometidas por mim. Assim como a mulher nua atrai o homem com seu corpo nu, assim meu corpo nu despojará a mulher de sua sedução devastadora. A cor da pele terá o mesmo poder da cegueira, aos que olharem o corpo nu do homem e da mulher com olhos de monstros canibais devoradores e avassaladores. Assim, eu termino esta oração à nudez com meu corpo em comunhão com o Sol que nasce pela eternidade que se encontra em todo crepúsculo e aurora. Nu, começarei esta caminhada, nu, avistarei pelos meus olhos a criaturas nuas e despidas de pudor, ou não, atiçarei olhares criminosos e pecaminosos, darei banho em criaturas sedentas de uma nudez feita pelo sempre estarem nuas, nuas em suas ambições e desejos de fraternidade. Assim serei este nu pensando em ter a todos numa certa cidade da nudez, a cidade feita do sonho que teima em prosseguir sua missão. Roupas em profusão deixadas no chão carcomido pelas guerras e miséria. A nudez, os nus, as nuas, a pele natural, sem marcas de tecidos apertados ou de um Sol que não chega em sua integralidade ao corpo. O corpo de um profeta nu é a salvação dos pecados terrenos. Somente se a nudez profética se concretizar teremos chance de termos um novo amanhã.



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